14.12.08

A Globo não é mais a mesma; graças a Deus!

Muitos anos atrás a rede Globo brindava seu público com teleteatros, talvez para se redimir por seu fundador, Roberto Marinho, ter sido um dos maiores lacaios da Ditadura Militar que tanto perseguiu o teatro neste país. Anos depois, sem a Ditadura, mas com a imbecilidade do público bem arraigada graças ao retrocesso cultural imposto pela Ditadura, acabaram-se os teleteatros da Globo, suas novelas ficaram mais numerosas e ainda menos inteligentes, e estreou o Big Brother, sem dúvida o ponto mais baixo já atingido por qualquer mídia em qualquer sociedade ou época. A minissérie Capitu, cujo último dos seus cinco episódios foi exibido ontem, é uma felicíssima retomada dos teleteatros da década de 70, com recursos técnicos de hoje.

A idéia de traduzir as insinuações e entrelinhas de Machado de Assis usando recursos teatrais e alegorias burlescas não é nova — houve nos anos 80 uma tentativa patética de verter nesse formato o Memórias Póstumas de Brás Cubas —, mas nunca foi tão bem-sucedida quanto nesta versão de Dom Casmurro adaptada por Euclydes Marinho para a TV. A direção de Luiz Fernando Carvalho é nada menos que perfeita, o elenco é impecável e a fotografia de encher os olhos. As vinhetas mostrando pedaços de fotos e recortes de jornais antigos retrata maravilhosamente as recordações fragmentárias do memorialista Bentinho. Este recebe seu apelido num trem da Central, não num bonde, e o Otelo a que assiste não é o de Verdi, mas o de Orson Welles, anacronismos expressionistas que acentuam melhor que qualquer montagem naturalista, de época ou não, a universalidade e perenidade do tema. O genial Bruxo do Cosme Velho teria ficado orgulhoso.

Aliás, leio na Veja que o subgênero da telenovela anda perdendo audiência, coisa impensável anos atrás. Notícias como essa, aliadas a obras da qualidade de Capitu, tornam mais fulgurante a luz que desponta no fim do túnel.