25.6.07

Nefertiti para crente

Quando o rei Aquenaton, que governou o Egito por mais de uma década do século XIV a.C., foi identificado pela primeira geração de egiptólogos que o estudou, no começo do século XX, como o "primeiro monoteísta da História", os fundamentalistas judeus e cristãos torceram o nariz ante a possibilidade de o Deus Único de seus livros sagrados ter sido invenção de um faraó. Uma cruzada difamatória foi, destarte, mobilizada contra esse personagem, a quem chamaram, e chamam ainda, de louco, tirânico, incestuoso, homossexual. Esta última acusação, absurda como todas as demais, surgiu ante a evidência de um baixo-relevo em que Aquenaton é retratado acariciando amorosamente um co-regente de nome Smenca-Rá. Estudos mais criteriosos revelaram que Smenca-Rá, na verdade, era outro título para a esposa do rei, a famosa Nefertiti. Tal foi o único fato histórico que a escritora Jacqueline Dauxois juntou às mencionadas calúnias em seu romance Nefertite. Feito para agradar aos fundamentalistas, esse livro tolo apresenta cada episódio do Êxodo como verdadeiro, inclusive Moisés boiando num cesto quando bebê e as pragas do Egito, coroando-os com o supremo disparate, sugerido pela autora, de que Nefertiti seria o tal faraó que perseguiu os hebreus por um corredor aberto no mar Vermelho e acabou tragado pelas águas junto com seu exército, graças à divina intercessão de Hollywood. Mais épico que qualquer livro ou filme é a falta de senso crítico de Dauxois, inacreditável mesmo para uma crente.