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Dois espetáculos de dança quase contrastantes: Kagemi e Boccatango. Dança butô e balé moderno, o milenar e o contemporâneo, o japonês e o argentino. O eterno e o efêmero.
As peças Família e A Pedra do Reino me levam à mesma reflexão do Porto Alegre em Cena do ano passado, quando Luís Melo interpretou Tchekov, não uma peça dele, que as tem tantas, e sim um conto de Tchekov. Por Melpômene, o que os diretores de teatro contemporâneos têm contra peças de teatro?
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Família é a versão teatral de um filme de Fernando Leon de Aranoa, e A Pedra é a adaptação de Antunes Filho para o romance de Ariano Suassuna. Resultado sofrível nos dois casos, como o seria, da mesma forma, um longa-metragem filmado não sobre um roteiro cinematográfico, mas a partir de uma partitura.
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Compreendo a sede de experimentalismo cênico em países europeus, que conhecem suas peças clássicas de memória e não mais suportam vê-las de forma tradicional. Mas aqui não há memória, e tradicionais são apenas os vícios da classe política.
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Teatro mesmo, autêntico, clássico, é Las Troyanas, do bom e velho Eurípedes. Não é a montagem mais cara e nem a mais bem dirigida, mas a única em que os termos "poesia" e "desempenho dramático" vêm à mente com alguma freqüência.
Por que os diretores não páram com seus experimentalismos, bons apenas para eles e para seus egos inflados, e não dão aos espectadores de teatro o que pertence aos espectadores de teatro?
Acredito que a raiz desse mal está na relutância em profissionalizar a arte cênica. Fazer um teatro dirigido ao público pagante, ou seja, um "teatro profissional", não é encarado como arte, e sim como comércio, ou prestação de serviço. Daí os diretores teatrais brasileiros insistirem no amadorismo, na experimentação, na encenação do próprio ego, o mais distante possível do texto para teatro. Afinal, se algum desses empirismos vazios e egocêntricos for bem-sucedido, o mérito recairá sobre o diretor, e não sobre algum grego morto há milênios.